UFSC e FIESC discutem perspectivas da neoindustrialização de SC

11/10/2023 17:07

O diretor de inovação da Fiesc, José Eduardo Fiates, abriu o evento (Fotos: Luís Carlos Ferrari/Secom)

A Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e a Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina (FIESC) discutiram o fortalecimento das indústrias catarinenses no encontro “A Neoindustrialização em Santa Catarina”, realizado no auditório do Espaço Físico Integrado (EFI), Campus de Florianópolis, na tarde desta segunda-feira, 9 de outubro. O encontro discutiu o Plano de Desenvolvimento Econômico Sustentável e Integrado de Santa Catarina (NeoSC), uma proposta da Fiesc, complementado com comentários de especialistas da UFSC sob as perspectivas econômicas, de inovação, trabalho, ambiental e de internacionalização.

O diretor de inovação da Fiesc, José Eduardo Fiates, abriu o evento com uma apresentação do NeoSC. Egresso da UFSC, ele estudou ecossistemas inovadores sob a perspectiva do venture capital. Fiates comentou que o plano começou a ser desenhado na FIESC durante a pandemia, quando a instituição foi pressionada a discutir o desenvolvimento econômico lidando em paralelo com o enfrentamento da doença. “Um evento extremo como este provoca três grandes ações: antecipa mudanças, acentua prioridades e traz o futuro para mais perto. Estes temas passaram a ser discutidos na federação”, afirmou o representante da FIESC.

Assista à transmissão do evento pela TV UFSC:

O planejamento da FIESC é baseado na mobilização de agentes do governo e sociedade para, além de acelerar o crescimento da indústria, ajudar no reposicionamento e implantação de novos segmentos, onde são analisadas tendências, estratégias, visão e metas e as possibilidades de engajamento. Ele envolve o “mapeamento e diagnóstico de variáveis, como o ecossistema vai evoluir ao longo do tempo. A lógica e envolver o ‘quem’ antes de tudo, os protagonistas responsáveis pelo engajamento”, disse Fiates, sobre o plano, que prevê uma série de fatores para cada região e setor da economia desenvolver suas vocações históricas e atuais.

“SC é o estado em melhores condições de inovação e tecnologia”, diz professor da UFSC

Professores e pesquisadores da UFSC fizeram comentários sob as perspectivas econômicas, de inovação, trabalho, ambiental e de internacionalização

O primeiro representante da UFSC a discutir o plano foi o ex-reitor, ex-secretário do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação e professor do departamento de Engenharia Mecânica, Álvaro Toubes Prata. Ele elogiou o plano da FIESC pela “capacidade de enxergar o Estado de uma maneira ampliada. Acredito no desenvolvimento regional que contempla todos os segmentos da vida em sociedade. Santa Catarina é o estado em melhores condições de inovação e tecnologia”. Prata fez uma ressalva ao plano: “Nossas dimensões são terra, água e ar. Santa Catarina tem uma dimensão hídrica, não custa pensar no mar, e o mar abriga uma série de coisas, inclusive a geração de energia”. Entre os conselhos do ex-reitor estão a manutenção de uma noção de prioridades. “A visão do setorial, regional e temático é muito inteligente, chegar com visão estratégica próxima das políticas estaduais e federais, ou seja não brigar com estado e governo, buscar aproximação”, realçou.

A professora Regina Rodrigues, da coordenadoria especial de Oceanografia e editora revisora do IPCC – Special Report on Climate Change and Land, apresentou a perspectiva ambiental. Para ela, o paradigma de que defender o meio ambiente vai contra o desenvolvimento econômico de um país deve ser quebrado, no que converge no plano apresentado pela FIESC. “Não existe uma dicotomia entre uma perspectiva ambiental-sustentável e desenvolvimento econômico e social. Estamos na economia do século XX e precisamos passar para a do século XXI. Não podemos ficar para trás, temos uma grande oportunidade como sociedade para dar o pulo do gato, do contrário vai ser necessário importar tecnologia para resolver os problemas”, expôs a professora.

Do ponto de vista econômico, frisa Rodrigues, é importante entender enfrentar os desafios apresentados pelas crises climática e de biodiversidade: “Quanto mais retardar, mais abrupto vai ter de fazer isso. É preciso um plano de transição para energia mais limpa, retreinar e realocar pessoas”. Ela comenta que Santa Catarina sempre teve chuvas bem distribuídas e agora existem períodos grandes de estiagem, com menos água. “O que vemos agora é uma estação de estiagem mais longa. Fica muito ruim para o agronegócio e para regiões urbanas, vem destruição com enchentes e deslizamentos. O custo disso é muito grande. Tem que levar a parte ambiental em consideração”, alertou a pesquisadora.

Pesquisador ressalta importância também do setor de serviços

A perspectiva econômica foi comentada pelo professor do departamento de Economia e Relações Internacionais e coordenador do Núcleo de Estudos de Economia Catarinense (Necat), Lauro Francisco Mattei. Ele expôs um histórico do planejamento econômico em Santa Catarina desde os anos 1950. “O diagnóstico para os anos 1960 e 70 era completar a infraestrutura de transportes, energia e comunicações, conceber uma estrutura produtiva forte para industrializar Santa Catarina”, ressaltou o professor.

Ele indicou que nos anos 1980 e 1990 isto foi abandonado e retomado nos anos 2000, sem sucesso prático. O professor destacou como preocupação a participação da indústria na composição do Produto Interno Bruto (PIB) ter diminuído desde a pandemia – mesmo encabeçado pela FIESC, o plano deveria levar em consideração o desenvolvimento do setor de serviços. Outros problemas a serem enfrentados são a litoralização da população e a consequente falta de sucessão nas pequenas propriedades rurais (um ponto de interrogação a ser levado em consideração para o futuro de um estado com diversos municípios dependentes da agricultura familiar); a precarização da vida e a informalidade no mundo do trabalho; e não ter o tratamento sanitário como prioridade.

Mattei também pontuou que o turismo por si não induz um processo de sustentabilidade. “Em Florianópolis, o plano diretor foi destruído por causa do lobby forte das construtoras, se não botar um freio, é na ilha toda, mas não é só na ilha, em todo o litoral”.

“Não existe indústria sem trabalhadores”, lembra professora

A professora do departamento de Sociologia e Ciência Política e presidenta eleita da Associação Brasileira de Estudos do Trabalho, Thaís Lapa, descreveu a perspectiva do trabalho em relação ao planejamento. “Olhar o desenvolvimento deve levar em consideração trabalhadores e trabalhadoras. Quais os atores que vão se beneficiar com o desenvolvimento?”, questionou. “Não existem indústrias sem trabalhadores. É preciso visibilizar como este projeto pensa estas pessoas e as localiza no processo de crescimento e desenvolvimento. Não se trata apenas de pensar nos setores que precisam se desenvolver, mas na qualidade dos empregos”, sustentou.

Para Lapa, a geração de empregos com qualidade tem a ver com remunerar melhor os empregos que não exigem melhor de qualificação. Ela lembra que Santa Catarina é um dos estados com maior número de acidentes de trabalho per capita e da descoberta de trabalhadores em estado análogos à escravização. “A gente poderia ser campeão de promoção de condições dignas e não neste tipo de indicador”, alerta.

Internacionalização também fez parte do debate

O professor do departamento de Economia e Relações Internacionais Fábio Pádua dos Santos analisou o plano pelo viés da internacionalização. Ele se baseou num questionamento: quais as bases reais para a internacionalização da economia catarinense? Santos analisou a balança comercial de Santa Catarina de 1997 a 2022, especialmente o aumento do déficit iniciado em meados dos anos 2000 e ampliado ainda mais a partir do período pandêmico. Santa Catarina tem uma abertura comercial maior do que o Brasil, com forte dependência nas importações, “que supera o esforço exportador”. No diagnóstico de Santos, “a economia catarinense depende muito da importação dos outros estados. A maior parte do PIB importa para produzir para exportar”. A partir do que leu do plano, Santos acredita que “falta interação entre estrutura e agência, senti falta do peso do passado sobre o presente para que ocorra esta mudança cultural muito grande”.

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