Conselho Universitário analisa parecer sobre trabalho da Comissão Memória e Verdade da UFSC

29/04/2025 20:50

A sessão foi aberta ao público e direcionada ao Auditório da Reitoria. Foto: Agecom/UFSC

O Conselho Universitário (CUn) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) analisou, em sessão realizada na tarde desta terça-feira, 29 de abril, parecer referente ao trabalho da Comissão Memória e Verdade (CMV) da instituição. Criada em 2014, a CMV foi instituída com o objetivo de investigar violações de direitos humanos ocorridas na UFSC durante a ditadura civil-militar (1964-1985). O referido parecer foi elaborado pelo conselheiro Ubirajara Franco Moreno e, devido à relevância dos temas tratados, a reunião foi transferida da Sala dos Conselhos para o Auditório da Reitoria, após decisão coletiva de torná-la aberta ao público.

O documento foi embasado por dois processos: (23080.018179/2024-90) um relativo ao encaminhamento das recomendações da CMV, e outro (23080.000600/2023-25) que trata de um pedido de impugnação do Relatório Final da Comissão, o qual foi apresentado pela advogada Heloísa Blasi Rodrigues, em nome da família do ex-reitor João David Ferreira Lima. Neste caso específico, adianta-se que o relator manifestou-se pelo não acolhimento da impugnação.

Advogada Heloísa Blasi Rodrigues falou sobre o processo na sessão. Foto: Agecom/UFSC

A impugnação alegava que o relatório violava os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, apontando, entre outros itens, acusações de corrupção, generalizações sobre a atuação do ex-reitor e críticas à compra de um imóvel pela UFSC. Apesar de ter sido reconhecida a legitimidade do pedido como exercício de direito constitucional, o parecer reiterou que o Relatório Final da CMV não configura ato administrativo passível de impugnação, dado seu caráter exclusivamente histórico e memorialístico.

O parecer destacou ainda que as comissões de verdade, regulamentadas pela Lei nº 12.528/2011, têm como objetivo esclarecer violações de direitos humanos e promover a reconstrução da memória histórica, sem efeitos jurídicos sancionatórios. No entanto, dois encaminhamentos foram propostos favoráveis aos impugnantes: que a petição receba publicidade equivalente à do Relatório Final, sem custos para a parte requerente, e que decisões sobre a retirada de homenagens ao ex-reitor sejam tomadas por meio de processo administrativo específico, e participação da família Ferreira Lima.

A Comissão de Encaminhamento das Recomendações (CER), criada em 2023 para implementar as medidas sugeridas no Relatório Final da CMV, corroborou o entendimento de que o material é histórico e não deve ser impugnado. Entretanto, sugeriu a exclusão de fatos anteriores a 1964 e recomendou a incorporação do acervo histórico do ex-professor Aluízio Blasi ao Arquivo Central da UFSC, para torná-lo acessível à pesquisa.

O parecer foi elaborado pelo conselheiro Ubirajara Franco Moreno. Foto: Agecom/UFSC

Em relação às homenagens, a CER manifestou-se favoravelmente à revogação do nome do campus Florianópolis, no bairro Trindade, com base nas evidências contidas no Relatório Final. O parecer de responsabilidade do professor José Isaac Pilati, reforçou que alterações em homenagens devem ser regulamentadas e deliberadas em processos específicos, com a participação da família do homenageado. Além disso, sugeriu a elaboração de uma resolução para normatizar o assunto.

A reavaliação das homenagens concedidas a figuras envolvidas em perseguições políticas no período da ditadura tem sido um dos temas mais sensíveis e gerado controvérsias. O parecer sugere que essa regulamentação seja incorporada ao Estatuto da UFSC, estabelecendo critérios claros para futuras deliberações.

As 12 recomendações apresentadas pela CMV foram elencadas pelo parecerista, além dos encaminhamentos propostos pela CER. Entre as iniciativas propostas, destacam-se a manutenção de acervos históricos, a criação de um programa de extensão voltado à memória e aos direitos humanos, a conclusão de um documentário sobre a UFSC durante a ditadura e a realização de uma Sessão Solene de desagravo a perseguidos políticos. Algumas medidas, como a publicação do livro Memórias Reveladas da UFSC durante a Ditadura Civil-Militar e a criação do Acervo Memória e Direitos Humanos, já foram parcialmente implementadas. Outras, como a construção de um memorial, ainda aguardam definições.

Para a proposta de criação de uma “Casa da Memória”, voltada para atividades de ensino, pesquisa e extensão sobre direitos humanos, recomendou-se que a iniciativa seja articulada com o Instituto Memória e Direitos Humanos (IMDH) da UFSC, evitando duplicidade de esforços. Adicionalmente, foi sugerido o fortalecimento do Serviço Especializado de Atendimento às Vítimas de Violência (SEAVi), com programas inspirados nas “Clínicas do Testemunho”, para acolher vítimas de violações de direitos humanos e promover reparação simbólica.

O relator registrou em seu parecer que “não basta registrar fatos passados; é necessário compreender os processos e as escolhas que possibilitaram as violações, de modo que a memória crítica atue como salvaguarda contra a repetição dos erros. Portanto, a investigação da responsabilidade coletiva da UFSC não pode ser entendida como um mero ajuste de contas com o passado, mas como um exercício vital de fortalecimento institucional e de compromisso com a democracia, a liberdade acadêmica e os direitos humanos”.

Após a leitura do parecer, a sessão foi aberta para a fala dos inscritos. Estudantes e servidores técnicos e docentes puderam participar deste momento histórico para a Universidade, bem como a advogada Heloísa Blasi. Diante da impossibilidade de encerrar o assunto na sessão deste dia, o reitor anunciou que será marcado uma nova data, de forma extraordinária.

Assista a sessão na íntegra:

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Rosiani Bion de Almeida / SECOM
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